Você já ouviu falar de cerveja trapista? Talvez tenha visto esse nome em algum rótulo belga ou em listas de "melhores cervejas do mundo". Às vezes ela custa mais caro. Às vezes é difícil de achar. Mas uma coisa é certa: quem prova uma boa trapista, sabe que tem algo diferente ali.
Mas o que faz essa cerveja ser tão especial? É só o marketing? É só a tradição? É só porque vem de um mosteiro? Nada disso. Neste guia, vamos te mostrar por que a cerveja trapista é tão valorizada, como ela é produzida e o que a diferencia de todas as outras.
Bora mergulhar nessa história?
O Que é Exatamente uma Cerveja Trapista?
Primeiro, é fundamental entender: cerveja trapista não é um estilo.
É, na verdade, uma origem, uma filosofia de produção e, acima de tudo, um selo de autenticidade.
O termo "trapista" vem da Ordem Trapista de monges (Cistercienses da Estrita Observância). São monges que vivem em clausura, trabalham em silêncio e seguem uma rotina rígida de oração, contemplação e labor físico. Alguns desses mosteiros produzem cerveja há séculos — com as próprias mãos, seguindo regras específicas, em escala limitada e com um propósito muito claro: sustentar a própria comunidade e destinar o excedente para obras sociais.
Por isso, cerveja trapista é sinônimo de autenticidade, tradição, cuidado e espiritualidade engarrafados.
As Regras para uma Cerveja ser Considerada Trapista Autêntica
Para ser chamada de cerveja trapista autêntica e carregar o cobiçado selo "Authentic Trappist Product", a produção deve seguir regras bem específicas definidas pela Associação Internacional Trapista (AIT):
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Produzida dentro do monastério: Sem terceirização. O monastério é o coração da produção.
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Supervisionada pelos monges: Mesmo que haja funcionários leigos, os monges devem estar ativamente envolvidos na supervisão e nas decisões sobre a cervejaria.
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Lucro não comercial: O dinheiro gerado deve ser usado para a manutenção do monastério e suas obras sociais, com qualquer excedente doado para caridade.
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Selo "Authentic Trappist Product": Este selo oficial, um círculo com a inscrição, é a garantia de que todas as exigências foram cumpridas.
Esse selo é o que realmente diferencia uma cerveja trapista legítima de outras que apenas se inspiram nesse modelo (as chamadas "Abbey Beers" ou "cervejas de abadia").
Conheça os Monastérios Trapistas que Produzem Cerveja
Até o momento, apenas 11 monastérios no mundo possuem o direito de produzir e vender cervejas com o selo trapista oficial. Alguns dos mais renomados incluem:
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Bélgica:
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Westvleteren: Frequentemente aclamada como a melhor cerveja do mundo.
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Chimay: Uma das mais famosas, com boa distribuição global.
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Rochefort: Conhecida por suas cervejas potentes e tradicionais.
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Orval: Com um estilo único, lupulado e maturado em garrafa.
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Westmalle: Os inventores do estilo Tripel.
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Achel: (Teve sua produção suspensa em 2021 e perdeu o selo de autenticidade.)
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Holanda:
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La Trappe: Produz uma das Quadrupel mais respeitadas do mercado.
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Zundert
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França:
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Mont des Cats: Produz em parceria com Scourmont (Chimay).
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Itália:
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Tre Fontane
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Inglaterra:
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Tynt Meadow: A única trapista inglesa.
Cada uma dessas cervejarias tem uma produção limitada e um portfólio exclusivo. Algumas vendem apenas localmente, outras têm distribuição mundial, mas todas seguem as mesmas regras e a mesma filosofia ancestral.
Por Que Essas Cervejas são tão Valorizadas?
A valorização das cervejas trapistas vai muito além do marketing:
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Tradição Genuína: São cervejas feitas há séculos, com receitas aprimoradas lentamente. Não há modismo, não há pressa. É o oposto da produção em massa: é história líquida em cada garrafa.
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Qualidade Imbatível: Com o lucro longe da equação comercial, o foco é total no sabor e na qualidade. A produção em pequena escala permite um controle rigoroso em cada etapa.
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Propósito Elevado: Ao comprar uma cerveja trapista, você não está apenas adquirindo uma bebida. Você está ajudando a manter um monastério vivo e a financiar ações sociais. É uma forma de participar de uma rede que valoriza o trabalho honesto e a espiritualidade.
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Sabores Incomparáveis: As cervejas trapistas geralmente apresentam fermentações complexas, muitas vezes com leveduras exclusivas de cada mosteiro, resultando em sabores profundos e evolutivos. A maioria delas passa por refermentação na garrafa, o que significa que continuam maturando e desenvolvendo nuances mesmo depois de engarrafadas.
Estilos Comuns nas Cervejas Trapistas (Embora "Trapista" Não Seja um Estilo)
Embora "trapista" seja uma origem, a maioria das cervejas produzidas pelos monges segue perfis clássicos, que inclusive inspiram cervejeiros artesanais pelo mundo:
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Dubbel: Cor marrom escura, sabor maltado, com notas de frutas secas e leve doçura. Teor alcoólico entre 6%–7,5%.
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Tripel: Cor dourada, com sabores frutados e de especiarias, e um final seco. Teor alcoólico entre 7,5%–9,5%. Westmalle é famosa por este estilo.
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Quadrupel: Cor marrom escura a quase preta, licorosa, com sabores complexos de frutas secas, toffee e caramelo. Teor alcoólico acima de 10%. A La Trappe é referência nesse estilo.
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Belgian Strong Dark Ale: Similar à Quadrupel, mas pode ter variações de nome entre os monastérios.
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Pale Ale Trapista (como a Orval): Um estilo mais único, seco, lupulado, com maturação em garrafa e, frequentemente, o uso de levedura Brettanomyces para complexidade extra.
O Processo de Produção: Respeito ao Tempo e à Natureza
O processo de produção de uma cerveja trapista varia um pouco entre os monastérios, mas compartilha algumas constantes que garantem sua singularidade:
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Receitas e Leveduras Exclusivas: Muitos mosteiros cultivam e utilizam leveduras próprias, que não são encontradas em nenhum outro lugar do mundo, sendo o "coração" da cerveja.
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Ingredientes Simples e Puros: Água, malte, lúpulo e levedura. Nada além do necessário, às vezes com adição de açúcar de cana belga para auxiliar na fermentação e refermentação.
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Fermentação Cuidadosa: Em tanques abertos ou fechados, a temperatura é controlada meticulosamente para que a levedura trabalhe lentamente, desenvolvendo complexidade.
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Refermentação na Garrafa: Açúcar e uma pequena dose de levedura são adicionados antes do engarrafamento. A cerveja continua fermentando na garrafa, o que ajuda na conservação e permite uma evolução contínua de sabor e aroma ao longo do tempo.
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Maturação Longa: Sem pressa. Algumas cervejas maturam por semanas ou meses antes de serem liberadas para o consumo.
Cervejas Inspiradas nas Trapistas: Uma Homenagem à Tradição
Nem toda cerveja belga é trapista. Muitas são chamadas de "Abbey Beers" (cervejas de abadia), elas são feitas fora dos mosteiros, por outras cervejarias, mas com inspiração profunda na rica tradição monástica.
Na Cervejaria Marbus, por exemplo, a gente se inspira nessa tradição centenária para produzir a nossa Quadrupel. Com alto teor alcoólico, carbonatação natural, fermento belga e um perfil de sabor que remete a frutas secas, caramelo, dulçor elegante e um final quente e reconfortante.
É a nossa forma de honrar essa história e essa escola cervejeira, mas com o nosso jeitão brasileiro, artesanal, livre de conservantes e feito com a paixão de Curitiba.
Como Apreciar uma Cerveja Trapista
Essas cervejas merecem um momento de calma e contemplação. Veja como aproveitar melhor:
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Use taças apropriadas: Tulipa, cálice ou taça belga realçam os aromas e a espuma.
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Sirva na temperatura certa: Entre 10°C e 14°C é ideal. Gelada demais, a cerveja esconde seus complexos aromas e sabores.
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Não agite: Como são refermentadas na garrafa, podem ter um sedimento de levedura no fundo. Sirva com cuidado para não turvar a cerveja.
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Deixe respirar: Assim como um bom vinho, elas podem abrir e revelar novas camadas de sabor à medida que entram em contato com o ar e a temperatura ambiente.
Por Que a Cerveja Trapista é tão Especial?
Porque ela carrega em cada gole tudo o que a gente mais valoriza numa boa cerveja:
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Tradição genuína
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Sinceridade e propósito
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Tempo dedicado
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Sabor real e evolutivo
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Qualidade inquestionável
É feita com atenção, sem pressa, com respeito aos ingredientes, ao ofício e às pessoas. E isso, meu amigo, você sente no primeiro gole.
Se você nunca experimentou uma cerveja trapista autêntica, coloque isso na sua lista, é uma experiência única que vale a pena ser vivida. E se busca uma interpretação dessa escola tão rica, mas com o frescor e a autenticidade de uma produção local, feita em Curitiba com paixão e sem conservantes, convidamos você a provar a nossa Quadrupel. Ela foi criada com o mesmo espírito de dedicação e qualidade, oferecendo uma complexidade que vale cada gole e honra a tradição belga com um toque brasileiro.